É dezembro e sempre que o final de ano se aproxima é a mesma coisa. A comerciante Marina Cruz, 39 anos, sente a mesma angústia, a mesma frustração por metas não alcançadas e o medo do ano que vai começar logo, logo. Marina não está sozinha. Esta condição que abala a rotina e as emoções da maioria das pessoas, com tendência ao foco das coisas negativas, é mais comum do que se possa imaginar. Mas será que precisa ser assim? Primeiro, é importante tentar entender por que isso acontece.
Quem explica é a psicóloga, especialista em Neuropsicologia Rogéria Leal Renz. Segundo ela, geralmente, quando pensamos em final de ano, nas festas, férias, vem junto a análise do que se realizou durante o ano, das metas atingidas, o que ficou para trás, as pendências essa cobrança interna e comparação contribuem de forma negativa na forma como nos sentimos nesse período. "Esses sentimentos negativos podem ser desencadeados de forma interna, de como se aprendeu desde a primeira infância a lidar com as frustrações, a autocobrança, a construção da autoestima , o amor próprio frente às comparações. Refere-se às vivências, aprendizado e personalidade de cada pessoa", diz ela.
De forma externa, continua Rogéria, os sentimentos negativos podem vir de situações que não estão no controle da pessoa, como lutos, doenças, perdas financeiras, empregos, que nessa época se intensificam pelas reuniões familiares.
Conforme a psicóloga, que atende no Núcleo de Atendimento Psicológico (NAP), em Novo Hamburgo, é natural que as pessoas tendam a lembrar de vivências negativas e desconsiderar as positivas. Isso porque o cérebro tende naturalmente a registrar as experiências negativas como uma forma aprendida de sobrevivência, chamado “viés da negatividade”, explicando assim que os eventos negativos geram respostas mais intensas e marcantes que eventos positivos.
De acordo com Rogéria, essa tendência de valorizar as experiências negativas é como um instinto de sobrevivência primitivo necessário, tendo como aprendizado focar nos estímulos negativos. "Para mudar essa tendência, precisamos da consciência dessa tendência e estratégias cognitivas de mudança desse padrão de pensamento", comenta Rogéria.
Como sair dessa, então? Segundo a psicóloga, para lidar de forma saudável com as cobranças, compromissos e expectativas que o contexto de final de ano desencadeia, torna-se de crucial importância fortalecer a inteligência emocional, que tem como principais pilares a empatia, as relações interpessoais, o autoconhecimento e regulação emocional. A aceitação dos próprios limites, a validação, valorização da própria caminhada, das conquistas, dos aprendizados e uma atitude compassiva consigo mesmo.
ATO DE RECLAMAR AFETA SISTEMA IMUNOLÓGICO
E o comportamento pessimista ou de pensamentos negativos pode ter consequências que vão além do que podemos imaginar. Do ponto de vista biológico, conforme Rogéria, o ato de reclamar constantemente libera no organismo os níveis de cortisol, o hormônio do estresse, isso pode resultar em uma inflamação.
Essa prática pode se tornar patológica quando segue três critérios: frequência, intensidade e prejuízos nas várias áreas da vida da pessoa. "Portanto, se a pessoa viver constantemente reclamando e essa tendência se tornar um padrão repetitivo na sua vida, seu sistema imunológico pode ficar mais fraco e assim ficar mais vulnerável às doenças. Sabemos que a reclamação constante traz prejuízos tanto físicos como emocionais, podendo atingir nas áreas profissionais, nos relacionamentos, nas amizades, entre outras", considera Rogéria.
Assim, é importante desenvolver a inteligência emocional como um processo contínuo de autoconhecimento. Isso ajuda no entendimento dos próprios sentimentos e na capacidade de controlar as emoções. Conforme a especialista, a inteligência emocional desenvolve habilidades que favorecem o bem-estar pessoal, a lidar com os próprios sentimentos e com os sentimentos dos outros. Favorece a lidar de forma mais tranquila diante de diferentes situações do dia a dia.
Então a dica da especialista para a Marina, nossa personagem que abriu esse texto e para você que lê é: procure exercitar essas habilidades, compartilhando as dificuldades que possa estar enfrentando, fortalecendo os vínculos familiares, tendo mais flexibilidade frente às próprias expectativas e sobre os outros, estabelecendo limites de tarefa, priorizando vivenciar o verdadeiro significado dessa data. "Deixe aflorar os sentimentos que condizem com as celebrações de final de ano", conclui Rogéria. Por isso, não hesite em buscar ajuda profissional, psicológica para aprender a se conhecer e ter uma vida com muito mais qualidade.