SALA DA TEACHER DAIA: Mais amor no ensino remoto, por favor

A afetividade está presente em todas as dimensões e é imprescindível para o desenvolvimento humano. Não há como pensar na aprendizagem sem considerar: as pessoas envolvidas, o ambiente em que ela ocorre e a formação de vínculos

Por Daiana Souza*

Em março de 2021, sentada na cadeira em frente ao meu computador, reflito: sou apenas mais uma professora/mãe/mulher completando um ano de pandemia, em confinamento, com passeios apenas ao supermercado e farmácias e dividindo minha rotina entre as aulas on-line dadas por mim e as aulas on-line em que minha filha participa. Somos milhares de malabaristas, e nossos malabares são os desafios do dia a dia desse “novo normal”.


Confesso que meus braços doem, de tanto juntar esses malabares do chão. Estão sempre caindo de minhas mãos. Mas um alento em meio a tanta tensão é estudar. Estudar, estudar, e estudar. Nunca senti tanto prazer em aprender coisas novas, em ler sobre o que eu gosto, e até sobre o que antes não gostava.


Eu me divirto ao participar das aulas de minha filha, podendo admirar o trabalho de outros professores e aprender novas técnicas e dicas de ensino. Além do contato, ainda que virtual, com crianças. Ao observar as aulas de minha pequena, comecei a ler mais sobre a relação entre afetividade e aprendizagem. Afinal, seria possível manter a mesma relação de afeto entre alunos e professores em um ambiente tão frio como o online? E os alunos, estão aprendendo de verdade neste “novo normal” escolar?


Alguns estudiosos das teorias do desenvolvimento como Jean Piaget (1896-1980) e Lev Vygotsky (1896-1934) já mostraram como a afetividade é relevante para o processo de desenvolvimento humano, e eu havia falado brevemente sobre isso no meu texto anterior.

Mas um educador em especial chamado Henri Wallon (1879-1962) foi quem fundamentou de forma mais aprofundada o papel e a importância da afetividade no desenvolvimento integral. Segundo Wallon, o ser humano constrói seu ser apenas porque se torna dependente de outro ser humano, e seu desenvolvimento é possível pela integração de três dimensões: afetiva, motora e cognitiva, conectando corpo, ambiente e meio social em que vive. A afetividade, portanto, está presente em todas as dimensões e é imprescindível para o desenvolvimento humano. Não há como pensar na aprendizagem sem considerar: as pessoas envolvidas, o ambiente em que ela ocorre e a formação de vínculos. As sensações que vão surgir diante do aprendizado são cruciais para a assimilação de conteúdos.


O afeto gerado nessa troca é fator chave para um aprendizado bem sucedido. Isso não quer dizer que no ensino remoto o prazer no aprendizado deva ser buscado a qualquer custo, ou que uma aula deve ser sempre divertida para atrair a atenção do aluno. Significa que precisamos pensar na qualidade dos vínculos que estabelecemos, no ambiente em que nossos alunos estão inseridos e na qualidade do conteúdo que ensinamos, pois sabemos que a aprendizagem pode ser prejudicada se nosso aluno passa horas a fio sentado em frente ao um computador, dentro de uma casa cheia de gente nervosa trabalhando em esquema “home office”, em que as coisas parecem estar em um tremendo caos familiar.

Talvez tenhamos nessa pandemia uma oportunidade de ser alento para aquela criança cansada, aquele adolescente deprimido ou adulto estressado. Talvez seja o momento de, finalmente, pensar na afetividade como elemento combustível de nosso dia a dia, para que as aulas remotas possam ser uma boa experiência para todos os envolvidos. Agradeço à escola de minha filha, que marca encontros diários com os aluninhos em um momento que eles podem se ver, se cumprimentar e contar as novidades. Não é melhor do que um abraço, mas já é um carinho a mais para quem está tão exausto de mediar relações através de uma tela fria.


*Publicitária e professora de inglês. Daiana Souza escreve quinzenalmente neste espaço. Tem alguma dúvida, comentário ou sugestão a respeito do tema? Utilize os espaços abaixo para comentários.