SALA DA TEACHER DAIA: Cringe é não ser bilíngue

Enquanto muitos usam seu tempo para debater o que é ser cringe ou não, outros baixam aplicativos como o Duolingo para estudar idiomas, buscam por cursos online ou presenciais, ou seja, continuam se desacomodando e buscando cada vez mais conhecimento

Por Daiana Souza*


Gosto de polêmicas. Acho que elas são muito úteis para colocar o cérebro a trabalhar. Por isso não quis ficar de fora da última discussão “bombástica” da internet, o tal do conceito cringe. Segundo a referida polêmica, a palavra cringe está sendo utilizada pelos internautas para falar sobre coisas, digamos, desconfortáveis e vergonhosas. Assistir a séries “antigas” como Friends, gostar de Harry Potter e de emojis com cara de choro são consideradas ultrapassadas pelos nascidos após os anos 2000, ou seja, os Geração Z. Obviamente que as coisas consideradas cringe pelos Gen Z surgiram antes dos anos 2000 e só puderam ser aproveitadas por quem nasceu entre os anos 80 e 90, os ditos millenials. Vemos, então, uma batalha virtual de gerações.

Mas, a briga é em prol do que, afinal? Como eu não encontrei absolutamente nenhuma utilidade prática nessa discussão sobre eu ser cringe por gostar de tomar café da manhã (sim, isso entrou em pauta) ou por gostar de Friends, achei melhor olhar para essa discussão de outra maneira, quem sabe mais útil: será que saber falar apenas uma língua - ser monolíngue em um mundo globalizado - pode ser considerado cringe? Pois bem, tenho cada vez mais certeza que sim. Nestes termos, quem sabe falar mais de uma língua está super “na crista da onda” (ps.: alerta de expressão cringe), cada vez mais atualizado e apto a marcar presença no mundo.

Poucos dias atrás tive o prazer de assistir a uma palestra da Prof. Dra. Aline Lorandi, pesquisadora em educação e pós doutora em neurociências cognitivas. A palestra foi promovida pelo Instituto Ivoti, onde faço Pedagogia, e fez parte das comemorações da Semana da Língua Alemã, celebrada no Brasil todo em diversas instituições de ensino. Nesta palestra Dra. Aline explicou como o cérebro aprende, e o aprendizado está intimamente relacionado às nossas emoções, histórias de vida e escolhas que fazemos em nosso caminho. E escolher falar mais de uma língua é uma das melhores decisões que podemos tomar, pois aprender um novo idioma faz com que nosso cérebro seja constantemente estimulado e nosso aprendizado seja maximizado.


Para as crianças, quanto antes aprender um novo idioma melhor, porque sua assimilação de novos sons e palavras em línguas diferentes é mais fácil na infância. Adolescentes e adultos também podem se beneficiar deste aprendizado, desfrutando de maior sensação de empoderamento e participação num mundo cada vez mais sem paredes. E o aprendizado, independente da faixa etária, acontece mais facilmente se durante o aprender boas sensações estão sendo vivenciadas pelos alunos. Segundo a pesquisadora, a emoção é a cola que a memória precisa para assimilar melhor as informações que recebe, portanto o que aprendemos com prazer é muito mais fácil de lembrar. Família e escola devem se esforçar para promover um ambiente de aprendizado onde se gere bem estar e segurança, pois esta promoção assegura uma aprendizagem mais eficaz.


Viver no mundo hoje requer ser bilíngue. Alguns dados que me impressionaram: existem 6.912 línguas no mundo, sendo que no Brasil existem 200 línguas, dentre elas duas oficiais: português e libras (linguagem brasileira de sinais). Diante deste cenário de superconexão global, não faz mais nenhum sentido escolher ser monolíngue! Não cabe mais acreditar que aprender duas línguas atrapalha o cérebro ou que adultos não podem aprender um novo idioma.
Existem inúmero mitos sobre o bilinguismo e aos poucos eles estão sendo derrubados. Dra. Aline também apresentou pesquisas recentes que indicam o quanto o bilinguismo pode fazer bem para o nosso cérebro. Estudos comprovam que ter aprendido uma outra língua garante reserva cognitiva (capacidade cerebral). Se por algum problema de saúde você perdeu cognição cerebral (como ter doença de Alzheimer, por exemplo), a reserva cognitiva ajuda você a se recuperar ou retardar os efeitos de perda cerebral. E o grau de bilinguismo de uma pessoa vai depender de um fator muito interessante: o de exposição ao idioma.
Quanto mais você se expõe à língua que quer aprender, mais você aprende. E essa exposição não depende somente de ter aula uma vez por semana; depende das músicas que você ouve, dos sites que frequenta e dos filmes que vê. Fique bastante tempo em contato com o idioma que seu aprendizado será maximizado. Arriscado dizer que ser bilíngue previne doenças mentais? Talvez sim, mas em breve não será mais tão longe de nossa realidade. Enquanto muitos usam seu tempo para debater o que é ser cringe ou não, outros baixam aplicativos como o Duolingo para estudar idiomas, buscam por cursos online ou presenciais, ou seja, continuam se desacomodando e buscando cada vez mais conhecimento. Acho que ser cringe é parar de estudar. Não é?


*Publicitária e professora de inglês. Daiana Souza escreve quinzenalmente neste espaço. Tem alguma dúvida, comentário ou sugestão a respeito do tema? Utilize os espaços abaixo para comentários.